A CRIANÇA E O NÚMERO
RESENHA
KAMII, Constance. A Criança
e o Número: implicações da teoria de Piaget para a atuação junto a escolares de
4 a 6
anos. Campinas, SP: Papirus, 1990.
Neste livro, Kamii busca
justificar sua metodologia para a construção da ideia de número pela via da
contagem, apresentando uma série de experimentos realizados com crianças de
diferentes faixas etárias, segundo os resultados das pesquisas desenvolvidas
por Jean Piaget, orientador e referencial teórico da autora. Os assuntos abordados na leitura inicial dão
conta de como a criança compreende a construção do número. Segundo a autora a
internalização do conceito de número
depende do nível mental que Jean Piaget (1998) nomeia de reversibilidade. Reversibilidade é a
capacidade de fazer, desfazer mentalmente a mesma operação. Para
ele a criança não pode conceituar adequadamente o número até que seja capaz de conservar quantidades,
tornar reversíveis as operações, classificar
e seriar. Assim, o educando (a) constrói, no seu intelecto, a noção de
número.
A
autora começa mostrando em seu livro dois tipos de conhecimento concebidos por
Piaget, o conhecimento físico (conhecimento da realidade externa) que pode ser
conhecido pela observação, e o Lógico-Matemático, que é a diferença existente
na relação entre dois objetos. Sendo assim, o número se torna a relação criada
mentalmente por cada indivíduo. Assim, o
educando (a) constrói, no seu intelecto, a noção de número fazendo-se
necessário desenvolver certas habilidades, desse modo, a observação exerce um
significado importante na aprendizagem.
No livro também estão colocadas algumas das questões
cruciais que desafiam especialistas, professores e pais em relação à aquisição
e ao uso do conceito de número pelas crianças de 4 a 7 anos. A criança nessa faixa etária é capaz de desenvolver várias
habilidades necessárias à construção da noção de número, como por exemplo: observar, contar, calcular,
classificar, seriar. A partir
dessas capacidades ela poderá ter condições de construir a inclusão hierárquica, que em síntese com a
ordem dos números, poderá construir o número, conseguindo realizar atividades
que demonstrem as quantidades.
Kamii afirma que, se as crianças conseguem construir os pequenos números
elementares ao colocarem todos os tipos de coisas em todos os tipos de
relações, elas devem persistir ativamente neste pensamento para complementar a
estruturação do resto da série.
Através de uma
figura (dois círculos ligados um ao outro) a autora mostra que o sucesso escolar depende muito da
habilidade de pensar autônomo e criticamente. A intersecção dos círculos
mostra as coisas que aprendemos na escola e que foram úteis para o desenvolvimento
da autonomia, por exemplo, a habilidade de ler e escrever, de ler mapas etc.
Para Kamii, “se a autonomia é a finalidade da educação, precisam ser feitas tentativas no sentido de
aumentar a área intersecção entre os dois círculos”.
Também coloca a autonomia em uma
perspectiva de vida em grupo. Para ela, a autonomia significa o indivíduo ser
governado por si próprio. É o contrário de heteronomia, que significa ser
governado pelos outros. A autonomia significa levar em consideração os fatores
relevantes para decidir agir da melhor forma para todos. Não pode haver
moralidade quando se considera apenas o próprio ponto de vista. Assim o
objetivo para ensinar o número é o da construção que a criança faz da estrutura
mental do número, e o professor, deve priorizar o ato de encorajar a criança a
pensar ativa e autonomamente em todos os tipos de situações. Para Kamii, uma
criança que pensa ativamente à sua maneira, incluindo quantidades,
inevitavelmente, constrói o número.
Kamii afirma em seu livro que o
meio ambiente proporciona muitas coisas que indiretamente, facilitam o
desenvolvimento do raciocínio lógico-matemático. E “as crianças de culturas
mais industrializadas geralmente desenvolvem-se mais rapidamente do que as de
cultura menos industrializadas”. E ainda “as crianças de nível socioeconômico
médio-alto desenvolvem-se mais rapidamente do que as de baixa renda, e as que
vivem na cidade, mais rápido que as da zona rural”. Ela elaborou também, seis
princípios de ensino sob três títulos:
- A criação de todos os tipos de relações
Encorajar a
criança a estar alerta e colocar todos os tipos de objetos, eventos e ações em
todas as espécies de relações.
- A quantificação dos objetos
a) Encorajar as crianças a
pensarem sobre numero e quantidades de objetos quando estes seriam
significativos para elas.
b) Encorajar a criança a
quantificar objetos logicamente e a comparar conjuntos (em vez de encorajá-las
a contar).
c) Encorajar a criança a fazer
conjunto com objetos móveis.
- Interação social com os colegas e os professores.
a) Encorajar a criança a trocar
ideias com seus colegas.
b) Imaginar como é que a
criança está pensando, e intervir de acordo com aquilo que pareça estar
sucedendo em sua cabeça.
O conhecimento matemático deve
ser apresentado aos alunos como historicamente construído e em permanente
evolução. Os recursos didáticos como jogos, livros, calculadoras, computadores
e outros materiais têm um papel importante no processo de aprendizagem. A
autora mostra ainda, a aplicação de jogos no auxílio à aprendizagem e fixação
dos conceitos matemáticos tem por objetivo fazer com que o educando aprenda e
construa os conceitos matemáticos através dos jogos.
O jogo e a brincadeira fazem
parte da vida de qualquer indivíduo. O encantamento, fascínio e fantasia dos
brinquedos e jogos acompanham o desenvolvimento da humanidade. Com relação ao
jogo como recurso para auxiliar a aprendizagem, Kamii traz que a criança
precisa ser encorajada na troca de ideias sobre como querem jogar, e ainda
mostra diversos modelos de jogos e brincadeiras que podem ser bem aproveitados
na aprendizagem da criança: dança das cadeiras, jogos com tabuleiro, jogos de
baralho, jogos com bolinhas de gude, jogos da memória etc.
“Os jogos são atividades tão prazerosas e interessantes, por que não os
trazer para a sala de aula e, assim, substituir as antigas atividades em folhas
intermináveis que tornavam a aprendizagem um tédio? Trazendo o jogo para dentro
da sala de aula, estaremos tornando a educação mais compatível com o
desenvolvimento natural das crianças, ou seja, contribuiremos, para que a
aprendizagem escolar seja relevante para o desenvolvimento.” (Constance Kamii).
Trabalhar com jogos é muito interessante
e gratificante, pois o aluno aprende brincando dentro da sala. Mas é preciso
que o educador tenha consciência que trabalhar assim não é fácil, exige uma
atenção maior sobre os alunos para identificar o que precisa ser trabalhado e
escolher o jogo certo para cada conceito matemático. Não se pode esquecer, que
para tal trabalho, deve ser questionado: por que, quando, para que, o que se
pretende, para que aulas não fiquem apenas no jogar por jogar.
O que levo de mais importante no livro é a colocação
de que segundo Piaget a criança não constrói o número pela transmissão social,
ou seja, aprendendo a contar. A estrutura lógico-matemática do número não pode
ser ensinada, ela é construída pela própria criança, através do estímulo do
professor proporcionando o desenvolvimento dessa estrutura mental através de
situações de relações diversas. A tarefa dos professores é de incentivar o
pensamento espontâneo das crianças e não apenas buscar respostas prontas.
Aprender a contar, ler e escrever numerais é importante, mas se a criança não
tiver construindo sua estrutura de número esta contagem, leitura e escrita será
apenas memorização, sem sentido numérico. Também achei muito importante o
resultado de uma pesquisa que indica que as crianças de nível sócio econômico
mais elevado, desenvolvem o raciocínio lógico matemático mais rapidamente que
os de baixa renda, isso influencia bastante na minha sala de aula, visto que
trabalho com crianças de nível socioeconômicos muito variados e com
pouquíssimos estímulos familiares, retardando bastante esse desenvolvimento do
pensamento lógico, não só na questão numérica inclusive na leitura e escrita.
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